O Processo de Regressão das Democracias Liberais
Crise Económica e Afrontamentos Políticos
Após a Primeira Guerra Mundial a Europa viveu tempos difíceis. Arruinada e fortemente endividada, procura resolver a sua débil situação com uma política inflacionista, só que a grande quantidade de moeda em circulação não corresponde ao incremento da produção, o que provoca uma desvalorização da moeda e uma alta de preços (inflação). Esta situação particularmente grave na Alemanha, Áustria e Hungria, países vencidos e que tinham de pagar pesadas indemnizações de guerra.
Os EUA, que tinham saído da 1ª G.M. como a maior potência industrial, sofreram a primeira crise em 1920-21, face à redução da procura externa e interna, o que provocou a desvalorização dos preços, a acumulação de stocks, a baixa d produção e a abertura de falências com os consequentes custos sociais (desemprego e conflitos). Dada a crescente dependência da economia europeia face à americana, esta crise arrasta os países industrializados da Europa.
A partir de 1922 inicia-se a recuperação da crise com o relançamento da actividade industrial em particular na indústria química e automóvel, aproveitando as inovações tecnológicas, a aplicação de métodos de racionalização de trabalho e de concentração de empresas.
Até 1929, os EUA e a Europa vivem um clima de euforia, de optimismo e confiança no capitalismo – “Os loucos anos 20”.
Esta prosperidade é, contudo, ilusória. A agricultura regista contínua descida dos preços devido à mecanização e à alteração dos hábitos de consumo, o que prova o endividamento dos agricultores e um êxodo rural. Na indústria, o desemprego aumenta devido ao desenvolvimento da mecanização, o que constitui uma ameaça ao consumo que assenta no crédito.
Assim, numa economia mundial que assentava no valor do dólar e nos créditos dos EUA, a mínima crise deste generalizaria em catástrofe. Foi precisamente a especulação bolsista que despoletou, em 1929, a maior crise no capitalismo mundial. A acumulação de ordem de venda de acções fez diminuir o seu valor – Crash bolsista -, conduzindo os accionistas e os bancos à ruína, na medida em que muitos dos títulos eram adquiridos a crédito. Com a falência dos bancos cessa o crédito, base da prosperidade americana, a produção industrial diminui e os preços baixam automaticamente, as falências sucedem-se, arrastando milhares de pessoas para o desemprego e o volume das trocas internacionais diminui.
A dependência das economias face aos EUA provoca a generalização da crise em quase todo o mundo, mas com grave incidência na Europa.
O quadro social do pós-guerra; os desmobilizados e as vítimas da inflação; a vaga revolucionária e o terror das classes médias.
A alta de preços do pós guerra e as crises monetárias atingem duramente os que vivem de rendimentos
A alta de preços do pós guerra e as crises monetárias atingem duramente os que vivem de rendimentos fixos, como pequenos proprietários e assalariados. O operariado enfrenta problemas de emprego, os agricultores vão à falência e o funcionalismo vê-se reduzido a uma situação de pobreza.
A reacção destas classes a esta situação diverge. Operários e agricultores, inspirados no sucesso da revolução russa, aderem a partidos de esquerda , iniciam um surto revolucionário que se traduz por vagas de greves gerais por toda a Europa, ocupação de fábricas e de terras em Itália, insurreições de carácter bolchevista na Alemanha. A classe média de funcionários e pequeno-burgueses e proprietários, afectados no seu poder de compra que quase os reduzia ao nível dos proletários, sente-se traída pelos governos democráticos. Culta, amante da ordem e da estabilidade, teme as convulsões sociais do marxismo e deseja governos fortes que a defendam.
São presa fácil os regimes de direita, conservadores (conservadorismo) e até fascistas que lhe garantem a paz, riqueza, dignidade e patriotismo. Pensavam que estes regimes autoritários seriam transitórios, até se estabelecer a paz e a segurança e uma prevenção contra o perigo bolchevista.
A reacção conservadora: a ascensão das forças da direita nos países europeus.
As dificuldades económicas e sociais deram origem a uma crise nas democracias liberais e a uma escalada de regimes autoritários e fascistas. Na Itália, aproveitando o descontentamento social, a crise económica e a inoperãncia governativa, Mussolini “marcha sobre Roma”, em Outubro de 1922, à frente dos seus camisas negras, e obriga Vítor Manuel III a demitir o governo e a nomeá-lo chefe do Governo.
Nas eleições de 1924, Mussolini conseguiu a maioria absoluta dos votos implantando uma ditadura fascista (fascismo).
Por toda a Europa, Letónia, Lituânia, Albânia, Jugoslávia, Hungria e Bulgária, instalaram-se regimes autoritários. Também em Espanha, entre 1923 e 1930, instala-se um regime autoritário, assim como em Portugal.
Na Alemanha, aproveitando a grave crise económica de 1929 e jogando habilmente com a humilhação do Tratado de Versalhes, Hitler consegue a implantação do Partido Nacional-Socialista. Conquista o apoio dos desempregados rurais, da pequena e média burguesia, desejosos de melhorar a sua situação e ganha também, a simpatia da grande burguesia, receosa do comunismo. Em 1932, o partido nazi venceu as eleições e Hitler é nomeado chanceler em 1933. (nazismo) .
No fim dos anos 30, as democracias europeias regrediam, resistindo apenas aquelas onde a tradição liberal era muito forte, como, por exemplo, a França e a Grã-Bretanha.
Génese e Implantação do Fascismo
O Estado Totalitário Fascista
A doutrina Fascista apoia-se nos seguintes princípios:
1. Na primazia do Estado sobre o indivíduo, que lhe deve ser totalmente subordinado. O Totalitarismo do Estado fascista é político (não pode haver oposição), económico, social e intelectual, isto é, tudo no Estado, nada contra o Estado, nada fora do Estado (Mussolini). Na Alemanha a realidade fundamental é o povo (Volk), a raça alemã, isto é, a mística do Estado na Itália fascista acrescentou o nazismo a mística da Nação.
2. Numa ordem antiliberal, anti parlamentar, antidemocrática e anti-socialista (Mussolini), que condena a democracia e o sufrágio universal que considera irresponsabilidade colectiva, mera tirania do número, quer para Mussolini, quer para Hitler.
Assim são as elites – os mais aptos – que devem governar. Os governantes fascistas são promovidos a heróis nacionais e a raça ariana na Alemanha é a raça dominante, onde estavam incluídas forças militares, filiadas no partido, e homens (a mulher era considerada subordinada ao homem).
3. No culto do chefe (chefe carismático), que é um homem excepcional, super-homem a quem todos devem obediência – “Acreditar, Obedecer, Combater” (Mussolini) – e amar – “Um Povo, Um Império, Um Chefe” (Hitler). Mussolini e Hitler rodeiam-se de uma poderosa máquina de propaganda, de grande espectacularidade, que os transforma em chefes carismáticos capazes de provocar o histerismo colectivo.
4. No enquadramento das massas de forma a conseguir uma nação submissa mas com alma colectiva.
Desde a infância que as ideias fascistas eram transmitidas pelas Juventudes Fascistas e Hitlerianas e pela escola subserviente aos regimes de modo a formar cidadãos com o culto do Estado e do seu chefe, amantes do desporto e da guerra.
Apesar destes regimes contarem com uma base social de apoio vasta – por que a classe média pretendia emprego e segurança, os quadros dirigentes da economia, do exército, da Igreja e até da cultura queriam estabilidade e os seus privilégios de classe, e as classes laboriosas o emprego para sobreviver -, os Estados criaram processos de enquadramento para melhor veicularem os seus objectivos. A filiação no partido único garantia privilégios a uma elite fascista, assim como a inscrição dos trabalhadores era obrigatória nas corporações. Uma poderosa máquina de propaganda apoiada nos modernos audiovisuais (rádio e cinema) e dirigida por ministérios promoveu os ideais do regime e padronizou toda a cultura. Uma férrea censura e a repressão policial exercida com violência pelas milícias armadas e pela polícia política (OVRA – Itália, Gestapo, SS e SA- Alemanha), sustentam a ditadura e eliminaram a oposição.
Particularidades dos regimes fascistas e nazi
A principal particularidade do fascismo italiano reside no corporativismo , sistema socioeconómico que preconiza a intervenção do Estado na construção de corpos profissionais compostos por patrões e trabalhadores – corporações. Este sistema é antimarxista e antiliberal e permite o controlo do Estado na vida económica e social.
Através das Leis das Corporações (1926), constituiu-se um sindicato patronal, um sindicato operário, proibiu-se a greve e o lock-out. Em 1934, organizaram-se corporações mistas de patrões e de empregados que estavam representados na Câmara Corporativa que substituía a Câmara dos Deputados.
Por sua vez, o nazismo aproveita a ideologia fascista a rejeição da igualdade entre os homens e leva-a até às últimas consequências. Concebia a História como uma luta entre as raças, de onde se destacava a raça superior – a ariana, os alemães, que pelas suas características deveriam dominar o Mundo, mesmo à custa da submissão dos povos ditos inferiores (judeus e eslavos).
O racismo nacional-socialista pretendia a expansão e afirmação da raça ariana, levando-a a utilizar os seguintes métodos:
1. O apuramento físico e mental da ariana através do eugenismo, aplicando as leis da genética à reprodução humana de modo a obter uma elite. Eram esterilizados os deficientes mentais e eliminavam-se os doentes incuráveis e os velhos na câmara de gás, enquanto se fomentava o casamento e a natalidade entre os verdadeiros arianos.
2. A preservação da raça ariana: perseguindo os judeus (anti-semitismo) , “povo de parasitas e destruidores de cultura”, no dizer de Hitler, que viviam na Alemanha. A perseguição começou com as leis de Nuremberga (1935), que proibiam os casamentos mistos e privavam este povo da nacionalidade alemã. Em 1938, Hitler confiscou as empresas e bens judaicos, proibiu a frequência de judeus em lugares públicos, remetendo-os para os guetos. Um ano depois, iniciada a Segunda Guerra Mundial, pôs em marcha a sua “solução final”, isto é, o genocídio de milhões de judeus e eslavos.
3. O militarismo, que está subjacente à necessidade de conquistar uma grande Alemanha, um “espaço vital” capaz de conferir grandeza ao povo alemão e de o ajudar a recuperar a sua economia (crise de 1929) e absorver o desemprego. Desrespeitando todos os tratados, o nazismo empreende uma política de remilitarização da Alemanha e anexa a Áustria (1938), ocupa a Checoslováquia (1939), para defender minorias alemãs, invade a Polónia (Setembro de 1939), iniciando a II Guerra Mundial.
O modelo soviético na era estalinista
Desenvolvimento económico
Após a morte de Lenine em 1924, Estaline toma as rédeas do poder na URSS, depois de afastar Trotsky e outros adversários políticos. Suspende em 1938 a NEP e retoma o reino do socialismo, adoptando um modelo de desenvolvimento económico centrado:
1. Na colectivização dos meios de produção, que implica a nacionalização das terras, minas, fábricas, meios de transporte, empresas e onde a propriedade privada foi abolida;
2. Planificação da economia, que cria planos económicos traçados pelo Estado, imperativos e com objectivos a atingir pelos sectores de produção durante o período de 5 anos – Planos Quinquenais.
Deste modo os campos agrícolas foram reorganizados em cooperativas de exploração – os Kolkozes -, cultivados em comum pelos camponeses da mesma aldeia, e os Sovkozes, propriedades estatais, exploradas por camponeses assalariados.
Õ comércio foi organizado em cooperativas de consumo e armazéns estatais e a industrialização a primeira meta a atingir.
O primeiro plano (primeiros 5 anos – 1928/1933), privilegiava a industria pesada, os transportes, a produção agrícola produtora de matérias-primas. O segundo plano (1933/38) deu prioridade à indústria têxtil, alimentar, à criação de gado com o objectivo de proporcionar à população melhor qualidade de vida. O terceiro plano (1938/45) estava dirigido para as indústrias químicas e produção energética, mas foi interrompido pela Segunda Guerra Mundial.
A concretização destes planos reveste grandes dificuldades, quer por falta de equipamentos técnicos e recursos financeiros, quer pela própria resistência da população. Por isso o Estado impôs métodos eficientes e persuasivos, tais como:
• Deslocações maciças de populações para as zonas de maior carência de mão-de-obra;
• Incentivo ao incremento de produção através da emulação, propaganda, prémios, diferenciação de salários;
• Medidas coercivas como o estabelecimento de brigadas de choque e a institucionalização da caderneta de operário e passaporte interno.
Os resultados foram espectaculares se tivermos em conta que em 1940 a URSS é a terceira potência mais industrializada do Mundo, embora com sacrifícios enormes para a população.
Totalitarismo repressivo do Estado e a burocratização do partido
Desde o início do governo de Estaline que se torna claro o aspecto totalitário do regime. O Estado é açambarcado pelo Partido Comunista numa confusão propositada, comum a todos os Estados totalitários. Em vez de ser o árbitro, como nos Estados liberais, o Estado fica dominado pelo PC, que se considera o único que defende os interesses do proletariado.
Serve-se de uma forte burocracia, onde tudo está submetido ao Partido e à sua política numa estreita hierarquização, que dá lugar a uma casta geradora de fortes diferenças sociais – a nomenclatura. Camponeses e operários, apesar dos progressos na instrução, na saúde e na assistência, tinham um reduzido poder de compra em comparação com os quadros políticos e intelectuais do PC.
A Constituição de 1936 definiu a URSS como um Estado Socialista, federal e garantiu os direitos fundamentais dos cidadãos como o sufrágio universal., liberdade de imprensa e outros, mas, na prática, o PC como “núcleo dirigente de todas as organizações do Estado controlava tudo, incluindo o ensino, a ciência, a literatura e as artes.
Estaline promoveu o culto da personalidade e instaurou um regime de terror, de violência totalitária, recorrendo a “campos de trabalho”, que forneciam mão-de-obra gratuita para as grandes obras nacionais, às purgas, às deportações e desterros, à polícia política.
A Resistência das Democracias e as Medidas de Resposta à Crise
A resposta à crise
As dificuldades económicas e nomeadamente a crise de 1929, abalaram os sistemas democráticos mais frágeis e generalizaram uma vaga de regimes autoritários e totalitários. Contudo, as velhas democracias, francesa e britânica, sobrevivem à crise económica e encontram juntamente com os EUA um meio de salvar o liberalismo através do intervencionismo do Estado.
A procura de consensos políticos: os governos de unidade nacional; as Frentes Populares; as medidas sociais em Inglaterra e França.
A resistência da democracia francesa passou pela constituição de um governo de Frente Popular ; coligação de esquerda que alcançou o poder em 1936, chefiado por Léon Blum.
Para resolver os problemas económicos, adoptou um conjunto de medidas, tais como:
• Nacionalização das industrias ligadas ao armamento;
• Aumento dos salários;
• Férias pagas (15 dias);
• Redução da semana de trabalho para 40 horas;
• Desvalorização do franco francês em cerca de 20%;
• Implementação de obras públicas;
• Estado tem um papel de mediador entre os trabalhadores e os patrões, assim como o de interferir na economia do país.
• Outro governo de Frente Popular subiu ao poder em Espanha (1936) mas arrastou o país para a guerra civil.
• Em Inglaterra, com objectivo de ultrapassar a crise, formaram-se governos de União Nacional, resultantes da coligação de partidos trabalhadores, liberais e conservadores.
• Este Governo legislou para:
• Proteger a Segurança Social, concedendo férias pagas, subsídios de desemprego, viuvez, orfandade e velhice, e promoveu a habitação social;
• Em matéria económica reorganizou a indústria, modernizou equipamentos, protegeu a produção nacional e a sua ligação com a Commonwealth e desenvolveu as obras públicas.
O Intervencionismo do Estado: O New Deal
1ª Fase (1933/34)
New Deal: programa lançado por Roosevelt (1933) baseado nas teorias intervencionistas de John Keynes,
Numa primeira fase o New Deal propõe-se relançar a economia e lutar contra o desemprego e a miséria através de:
• Medidas financeiras rigorosas: que controlavam as instituições bancárias, estabeleciam sanções para os especuladores e fomentavam uma inflação controlada;
• Política de obras públicas: parta combater o desemprego, através da construção de estradas, barragens, aeroportos, vias-férreas, escolas…
• Protecção à indústria: através da fixação de preços e quotas de produção, garantindo o salário mínimo e a liberdade sindical;
• Protecção à agricultura: através de empréstimos bonificados e indemnizações que compensassem a redução das áreas cultivadas.
2ª Fase (1935/38):
• Este segundo New Deal teve um carácter vincadamente social, assumindo-se os ideais do Estado Providência (Wellfare State), o Estado intervém e promove a segurança social de modo a garantir o bem-estar e a felicidade dos cidadãos, mediante as reformas de velhice e invalidez, a criação de fundos de desemprego, do estabelecimento de salários mínimos, de férias pagas e semana de 44 horas.
A Aliança Internacional das forças democráticas na luta contra o imperialismo do Eixo
Em 1940 a Itália, a Alemanha e o Japão assinaram uma aliança militar – O Eixo. Perante a impassividade da Sociedade das Nações:
• O Japão invade a Manchúria (1931);
• A Itália a Abissínia (1935);
• A Alemanha remilitariza a Renânia (1936);
• A Itália e a Alemanha participam na Guerra Civil Espanhola;
• Em 1938 a Alemanha anexa a Áustria; a Boémia e a Morávia;
• Em 1939 estabelece com a URSS um Pacto de Não-Agressão Germano-Soviético que pretendia partilhar a Polónia entre os dois países;
• Em 1939 a Alemanha invade a Polónia e é só nesta altura que a Inglaterra e a França declaram guerra ao Eixo. Iniciava-se a II Guerra Mundial com a adesão posterior da URSS e dos EUA.